sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Pessoas que amam demais

Existem pessoas que amam como quem defeca.
Há uma fase do desenvolvimento infantil que se caracteriza pela busca do controle dos próprios esfíncteres. Esta fase, também chamada de educação para a limpeza, é o momento em que nossos pais ou cuidadores desejam se livrar do ônus de nos trocar as fraldas e começam a nos dizer que existe uma hora e um lugar certos, onde devemos depositar nossos excrementos. Infelizmente isso geralmente se dá numa idade em que a criança não tem percepção suficiente do próprio corpo para ser capaz de controlar algo tão sutil quanto o esfíncter anal, por exemplo, e quando ainda não tem noção de identidade que exclua de si os seus feitos.
Assim sendo, o fazer coco no peniquinho demanda um esforço físico e psíquico que acaba por criar na consciência a noção de que ser capaz de controlar-se e de satisfazer as expectativas do ambiente é o que há. Tal criança acredita que está presenteando os pais por cumprir-lhes as regras e que merece por tanto a sua aprovação e reconhecimento.
Na fase adulta, as pessoas que permaneceram de alguma forma estagnadas neste momento de seu desenvolvimento, acreditam que por darem o que consideram ser o seu melhor merecem receber o que desejam. Para a criança esse melhor são suas fezes, sua primeira grande produção, seu presente para o mundo.
Adultos que amam assim procuram reproduzir em seus relacionamentos essa relação entre produção e satisfação: " Eu te dou carinho, afeto, atenção, presentes, sexo; te levo para passear; te dou liberdade...Como você pode não estar satisfeita!?! Como você não pode reconhecer que sou o melhor para você!?!
Tais pessoas se traduzem como grandes amantes incompreendidos, homens e mulheres que amam demais, que se doam completamente e nunca encontram alguém capaz de corresponder à nobreza de sua alma.
Na sua concepção narcisista da realidade não conseguem perceber que o que consideram ser o seu melhor não é necessariamente satisfatório para o outro ou o que pretendem dar, como liberdade e prazer, simplesmente não lhes pertence.  
Em verdade, não se relacionam de fato, pois relacionar-se envolve perceber o outro e ser percebido por ele e não simplesmente fazer do outro o depósito de seus dejetos afetivos, de suas dores e angústias, dos seus excrementos emocionais enfim e traduzir isso como: " Eu sempre te dei o meu melhor."
Amar não é fazer a coisa certa. Amar não é buscar em alguém ao preenchimento de seu vazio interior. Amar é compartilhar completude.
Por isso, quando encontro alguém ansioso por me dar o seu melhor, eu respondo, educadamente:
"Desculpe-me! Seu melhor não é o que é bom para mim."




Debora Damasceno
Blog: ossentidosdoprazer.blogspot.com