Existem pessoas que amam como quem defeca.
Há uma fase do desenvolvimento infantil que se caracteriza pela busca do controle dos próprios esfíncteres. Esta fase, também chamada de educação para a limpeza, é o momento em que nossos pais ou cuidadores desejam se livrar do ônus de nos trocar as fraldas e começam a nos dizer que existe uma hora e um lugar certos, onde devemos depositar nossos excrementos. Infelizmente isso geralmente se dá numa idade em que a criança não tem percepção suficiente do próprio corpo para ser capaz de controlar algo tão sutil quanto o esfíncter anal, por exemplo, e quando ainda não tem noção de identidade que exclua de si os seus feitos.
Assim sendo, o fazer coco no peniquinho demanda um esforço físico e psíquico que acaba por criar na consciência a noção de que ser capaz de controlar-se e de satisfazer as expectativas do ambiente é o que há. Tal criança acredita que está presenteando os pais por cumprir-lhes as regras e que merece por tanto a sua aprovação e reconhecimento.
Na fase adulta, as pessoas que permaneceram de alguma forma estagnadas neste momento de seu desenvolvimento, acreditam que por darem o que consideram ser o seu melhor merecem receber o que desejam. Para a criança esse melhor são suas fezes, sua primeira grande produção, seu presente para o mundo.
Adultos que amam assim procuram reproduzir em seus relacionamentos essa relação entre produção e satisfação: " Eu te dou carinho, afeto, atenção, presentes, sexo; te levo para passear; te dou liberdade...Como você pode não estar satisfeita!?! Como você não pode reconhecer que sou o melhor para você!?!
Tais pessoas se traduzem como grandes amantes incompreendidos, homens e mulheres que amam demais, que se doam completamente e nunca encontram alguém capaz de corresponder à nobreza de sua alma.
Na sua concepção narcisista da realidade não conseguem perceber que o que consideram ser o seu melhor não é necessariamente satisfatório para o outro ou o que pretendem dar, como liberdade e prazer, simplesmente não lhes pertence.
Em verdade, não se relacionam de fato, pois relacionar-se envolve perceber o outro e ser percebido por ele e não simplesmente fazer do outro o depósito de seus dejetos afetivos, de suas dores e angústias, dos seus excrementos emocionais enfim e traduzir isso como: " Eu sempre te dei o meu melhor."
Amar não é fazer a coisa certa. Amar não é buscar em alguém ao preenchimento de seu vazio interior. Amar é compartilhar completude.
Por isso, quando encontro alguém ansioso por me dar o seu melhor, eu respondo, educadamente:
"Desculpe-me! Seu melhor não é o que é bom para mim."
Debora Damasceno
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